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Um punk do subúrbio na selva de pedra carioca



Entre embalagens, sabores, imagens, ritmos, cheiros e roupas, retrato aqui, algumas memórias de minha geração. Coca-cola, vinil, jeans rasgado, coturnos, mochilas com botons e riscadas com canetas esferográficas Kilométrica e BIC azul. Ramones, Replicantes, Inocentes, Ratos de Porão e Garotos Podres, eram alguns sons que faziam minha cabeça.

A harmonia dos abacateiros, mangueiras, das jaqueiras, com monumentais copas e sombras bem características e marcantes, pássaros e micos, de meu bairro no subúrbio da central, me trazia um pouco de tranqüilidade, um bairro que mais parecia uma cidadezinha de interior, pequenas hortas no fundo das casas, foram algumas lembranças que registraram e acompanharam o desenrolar desse crescimento e movimento.

Cotidiano e costumes de rotina bem específicas, em que as senhoras colocavam suas cadeiras nas calçadas para papear com os vizinhos da rua, principalmente a noite em dias quentes. Com isso do ano nada melhor do que do que aqueles banhos frios de borracha me salvavam dos 40 graus e tornava mais sedutora a idéia do banho de manhã, bem característico da rotina do Rio de Janeiro.

Os refrigerantes Grapette de uva e Crush de laranja foram sendo substituídos pela apresentação da Coca-Cola, por exemplo; primeiro fomos surpreendidos ao depararmos com a simpática garrafinha em miniatura, que serviam de enfeites na estante da sala e que me mobilizava para colecionar as tampinhas que depois seriam trocadas por essas miniaturas isso era o maior barato, me fazia sentir enturmado e mais interado com a indústria cultural.

Depois numa tentativa de juntar-se a outras tribos, principalmente com a galera do skate aos domingos, aderi a uma versão de 2 litros, para suprir a todos numa só embalagem, agora de plástico transparente, mas que vinha surfando na idéia do mundo plastificado e dos enlatados. Nesse momento o país vivia um período importante, chegava a distensão política, era o fim da ditadura militar, a redemocratização tinha chegado, o congresso elegia o presidente, isso era nos meados dos anos 80 e que marcou bastante, parecia aquele grito que estava sufucado, com as charges do Henfil e o movimento das Diretas Já, as manifestações nas ruas me empolgavam gostava de velas, lembro inclusive daquele grafite nos muros da cidade que me chamava muito a atenção e tentava copiar na parede de meu quarto, “CELACANTO PROVOCA MAREMOTO”, em que aquele peixinho expressava esse momento de transformação política e da mudança na história do Brasil.

Integraram-se as evidências dessa cidade, fazer parte deste cenário chega ser intrigante, pois tinha a preocupação em manter as origens do nordeste, em especial da Paraíba, de onde vieram os costumes que até hoje carrego e que me preocupava em não desaparecer, era quando me rendia à tentação da Feira de São Cristóvão, mantendo viva as lembranças os sabores, cheiros e expressões carimbados pela memória de meus pais, valorizando a autenticidade de uma cultura que se mantiveram com os migrantes que chegaram ao Rio de Janeiro em busca de espaços.

Penso também nas noites em que marcávamos os encontros com os amigos e companheiros Punk´s do movimento estudantil para organizar as nossas colunas nas passeatas organizadas pela UNE e UBES. Era ali, o ambiente cultural da Rua Ceará e o Garage, na Praça da Bandeira. Enquanto ao meu lado um amigo declamava um poema, em cima de um caixote de feira livre, o som reproduzido no fundo era do Sex Pistols, neste momento um outro grupo se aproximava de um muro bem alto e começa a fazer pichações com colorjet vermelho e amarelo símbolos e palavras anarquistas e de ordem punks, enquanto as pessoas passavam conversando sobre o evento daquela sexta-feira, a rua bem cheia e tomadas por moicanos de todas as cores, as calçadas próximas a casa de show, jovens à frente estão com suas cervejas na mão, na esquina uma galera conversa com umas garotas que trabalhavam na Vila Mimosa.

O ambiente é de bastante movimento, uma fila se preparava e ia sendo formada para a entrada do show, um cartaz com um luminoso de neon bem grande na frente da bilheteria anunciava as bandas da noite Exploted, Gangrena Gasosa, Ratos de Porão, Cólera era uma febre. Na calçada do outro lado da rua jovens estudantes reunidos em uma roda discutem as estratégias para a passeata convocada pelas entidades estudantis, para a próxima semana, os Grêmios dos Colégios Visconde de Mauá, de Marechal Hermes, do CEFET e Ferreira Viana, no Maracanã e Pedro II, Centro, era no Garage que nos reuníamos, em plena Praça da Bandeira, ao lado da Estação de trem o que me fazia pensar, combinar, descombinar as coisas, objetos, sentidos, experiências e expressões o que tornava única essa experiência do imaginário construído de uma cidade, que em prol de um coletivo buscava estar juntos para a celebração de uma noite de muito rock.



Eduardo Araujo e Thati Mendonça - 07/08/2010
Oficinas Apalpe - A palavra da periferia

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